A viagem de estudos semestral é uma tradição no Curso de Arquitetura e Urbanismo da ULBRA campus Torres que, neste semestre de 2019/1, levou ao Uruguai um grupo de 25 alunos acompanhados pelos professores Anallu Barbosa, Efreu Quintana, Marcos Bueno e Renata Matos.
O grupo partiu de Torres, no dia 23 de maio para passar um período de uma semana conhecendo a arquitetura, urbanismo e paisagens do país vizinho. Formando um quadro abrangente da história e da cultura arquitetônica, o roteiro incluiu as cidades de Punta del Este, Montevideo e Colonia del Sacramento, além de alguns exemplares arquitetônicos isolados, nas localidades de Rocha, Atlántida e Soca.
A primeira parada, logo após o ingresso no Uruguai, foi na Fortaleza de Santa Teresa. Trata-se de uma fortificação que fazia parte da chamada linha de castillos grandes, no limite entre as terras de Portugal e Espanha. Sua construção foi iniciada pela Coroa Portuguesa, em 1762, passando em seguida para o domínio espanhol, e alternando de mãos, primeiro entre Portugal e Espanha, e depois entre Brasil e Argentina, com os sucessivos tratados e conflitos até a independência do Uruguai em 1928. É uma típica construção militar da época posterior ao renascimento, caracterizada por terraplenos e muralhas baixas e largas construídas em pedra, para suportar as cargas de artilharia e baluartes avançados para vigia e posicionamento dos canhões.
No início da tarde o grupo já se encontra na cidade de Punta del Este e desloca-se até Punta Ballena para conhecer a Casapueblo, icônica construção realizada num estilo único ao longo de décadas pelo artista plástico Carlos Paez Vilaró. O edifício abriga a casa da família de Vilaró, um hotel e um museu dedicado à obra do artista. Após a visita ao museu o grupo assistiu ao por do sol nos terraços da Casapueblo, momento em que se ouve nos autofalantes da Casapueblo a declamação de uma poesia dedicada ao sol na voz de Vilaró.
Na manhã do sábado, dia 25 de maio, o passeio foi em dois balneários próximos: Manantiales e José Ignacio. Em Manantiales, visitou-se o Conjunto Terrazas de Manantiales, um condomínio à beira-mar, projetado em 1978 pelos arquitetos argentinos Justo Solsona, Flora Manteola, Javier Gómez e Josefina Santos, junto com o arquiteto uruguaio Rafael Viñoly.
Já em José Ignacio, a experiencia foi a de caminhar à beira-mar e ver a urbanização e a implantação característica das edificações nas pequenas praias uruguaias, ruas e caminhos com pouca área pavimentada e muito respeito ao ambiente natural. Na praia de José Ignácio o grupo pode conhecer a casa La Roca, famoso projeto do arquiteto chileno Mathías Klotz.
De volta à Punta del Este: almoço e percurso a pé pelo centro do famoso balneário, com a indispensável parada para fotos junto ao monumento Los Dedos, do artista Mario Irrazábal. À tarde visitaram-se duas Casas Rifa. As casas de Arquitetura Rifa são sempre produto de concursos de arquitetura em que participam estudantes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidad de la Republica del Uruguay, acompanhados de um arquiteto orientador. O concurso existe desde os anos 1950 e tem como finalidade financiar a viagem de estudos de volta ao mundo que os estudantes de arquitetura uruguaios fazem a partir do terceiro ano de curso. O projeto vencedor do concurso, a cada ano, é construído e a casa é rifada para angariar fundos para a viagem. A rifa da arquitetura é uma tradição e a comunidade uruguaia sempre participa adquirindo números do sorteio. Nesta ocasião foram visitadas duas casas: a Casa Rifa 2012, de autoria de Leandro Villalba, Nicolás Rudolph, Omar Vila, Joaquín López, Pablo Canén, Patrick Apolant, Sebastián Martinez, em colaboração com Santiago Pons e Alma Varelav, concluída em 2014. E a Casa Rifa 1999, projetada por Federico Mirabal, Fernando Silva, Marcelo Bednarik, Martín Cobas e Mateo Juanche, assessorados por Jorge Durán Martinez.
No encerramento do dia, o grupo teve a oportunidade de conhecer o Museu Rali, que conta com um respeitável acervo de obras de artistas latino-americanos, além de uma exposição permanente de esculturas de Salvador Dalí. Nesta data ainda estava em cartaz uma exposição com desenhos feitos por Marc Chagall para os vitrais da Sinagoga do Hospital Universitário Hadassah Ein Kerem, em Jerusalém.
No domingo, logo de manhã, o grupo voltou para a estrada para ver duas singulares edificações religiosas. Na cidade de Soca, conheceu Capela erigida em homenagem à poetisa Susana Soca, única obra religiosa do arquiteto Catalão Antoni Bonet. Perto dali, em Atlántida, encontra-se um dos pontos altos da viagem, a Iglesia de Cristo Obrero, obra do engenheiro Eládio Dieste, realizada em 1952. Nessa, assim como em boa parte das suas obras, Dieste fez uso da tecnologia da cerâmica armada, que ele mesmo desenvolveu. Essa técnica possibilita construções econômicas e com grande eficiência estrutural, tendo como base o uso do tijolo para vencer vãos expressivos com grande economia de material, devido também ao uso das cascas e estruturas resistentes pela forma.
Depois de um percurso de mais de 200 quilômetros, o grupo chega em Colonia del Sacramento e se encontra com o guia local, Sr. Horácio, que acompanha alunos e professores num recorrido pelo centro histórico. Reconhecida pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade, Colonia foi fundada em 1680 por portugueses que objetivavam controlar o acesso ao continente pelo Rio da Prata. O traçado urbano do centro histórico difere de todas as demais cidades uruguaias por não apresentar a quadrícula típica das cidades coloniais espanholas. A ocupação da península onde se localiza a cidade num ponto estratégico para o controle do trafego de mercadorias pelo Rio da Prata é marcada pela disputa entre as Coroas de Portugal e Espanha e sua arquitetura apresenta traços das técnicas construtivas e estilos arquitetônicos portugueses e espanhóis em um bem preservado conjunto com exemplares dos séculos XVII, XVIII e XIX. Entre outros pontos de interesse, se destacam os remanescentes da muralha e da porta da muralha sul, restaurados e reconstruídos em parte pelo arquiteto Miguel Ángel Odriozola, que também restaurou muitos dos edifícios do centro histórico, e é autor da adaptação do antigo Bastión del Carmem, que foi parte das fortificações da cidade, cujas estruturas remanescentes foram aproveitadas em uma construção fabril no século XIX, e foi convertido em centro cultural, em 1997, por Odriozola. No percurso, o grupo ainda conheceu a Iglesia del Santísimo Sacramento, edificada originalmente em 1680, reconstruída parcialmente por Tomás Toríbio no início do século XIX e restaurada por Odriozola em 1995.
De Colonia del Sacramento o grupo rumou para a capital uruguaia, Montevideo, onde na manhã de segunda-feira foi recebido no escritório de arquitetura MAPA, que tem sede em Montevideo e Porto Alegre. O arquiteto sócio do escritório Mauricio Lopez Franco muito gentilmente fez uma apresentação sobre sistema de trabalho da empresa nas suas duas sedes e apresentou alguns trabalhos recentes. O MAPA, além de ampla participação em concursos de arquitetura, se caracteriza por uma consistente investigação sobre as relações da arquitetura com a paisagem e no desenvolvimento de técnicas de pré-fabricação, o Minimod e as intervenções na área da vinícola Sacromonte são exemplos dessa produção.
Após a visita ao MAPA, Maurício acompanhou os estudantes em um tour pelo edifício onde se localiza o escritório uruguaio. O Edifício Panamericano, construído em 1964, é um ícone da arquitetura moderna no Uruguai, projeto do importante arquiteto Raul Sichero Bouret.
Depois de uma caminhada pela baía de Pocitos, as atividades da tarde foram guiadas pelo Arquiteto e professor Martín Pronczuk, que forma o escritório MASA junto com o arquiteto Santiago Saetone, ambos conhecidos dos alunos da ULBRA Torres, pois já ministraram palestra e coordenaram o Workshop Orla, em Torres. Martín acompanhou o grupo em visita à Facultad de Arquitectura, Diseño e Urbanismo da Univeridad de la República (FADU/UDELAR), onde apresentou o edifício projetado em 1946 por Román Fresnedo Siri. Também falou sobre o ensino de arquitetura no Uruguai e a organização do curso em diversos talleres,cada um comandado por um professor decano, e que nestes talleresa organização pedagógica é bastante peculiar, com integração entre as diversas disciplinas de projeto.
O professor arquiteto Martín ainda acompanhou o grupo na Facultad de Ingenería, edifício brutalista projetado em 1936 por Julio Vilamajó, que recebeu, nos anos 1990 uma intervenção, na qual o arquiteto e ex-diretor da FADU Gustavo Scheps, inseriu uma série de passarelas e plataformas metálicas atirantadas na estrutura original de concreto, de modo a ampliar a área útil do edifício no interior de um pavilhão, então desativado. Martín também mostrou o aulário, um edifício novo também projetado por Scheps.
Antes de retornar ao hostel, fez-se uma parada no edifício da Intendência de Montevideo, projeto escolhido por concurso vencido por Mauricio Cravoto em 1930. Do mirador localizado no terraço do edifício é possível ter uma vista panorâmica da cidade, aproveitando a vista no local os professores do Curso de Arquitetura da ULBRA Torres deram uma aula sobre a arquitetura e o urbanismo de Montevideo. A partir dali a comitiva seguiu em um percurso a pé pela Avenida 18 de Júlio, a principal da cidade, passando por importantes prédio históricos e pelas praças de Cagancha, Fabini e Independência.
A terça-feira foi dia de conhecer o centro histórico de Montevideo, começando pela Praça Independência, e prédios do seu entorno como os famosos Palácio Salvo, e Edifício Ciudadela. Na Praça Independência está localizado o Mausoléu de José Artigas, herói da independência do Uruguai, construído em 1977 a partir de concurso ganho pelos arquitetos Lucas Ríos e Alejandro R. Morón. Sobre o mausoléu subterrâneo, ergue-se a estátua equestre de Artigas, do escultor italiano Angelo Zanelli.
Ainda pela manhã realizou-se uma visita guiada ao Teatro Solis, imponente e tradicional teatro com palco italiano, projetado em estilo neoclássico por Carlo Zycchi e com alterações feitas pelo arquiteto Francisco De Garmendia, inaugurado em 1856.
Do teatro, seguiu-se o recorrido pela chamada Ciudad Vieja, um percurso a pé, passando por importantes prédios de diferentes épocas, como a Associação dos empregados bancários, CAF, Palácio ferrando, Club Uruguai, entre outros, e por espaços públicos significativos como as Praças Constituición, que era a antiga Plaza Mayor, como se chamavam as praças fundacionais das cidades coloniais espanholas, e a Praça Zabala, girada em relação à malha urbana, que era onde ficava a primeira fortificação militar. No almoço, no tradicional Mercado del Puerto, a oportunidade de conhecer a arquitetura em ferro importada da Inglaterra e vivenciar um pouco da cultura local degustando uma típica parilla uruguaia. Na continuação da caminhada pela Ciudad Vieja, uma visita ao terreno escolhido para o desenvolvimento da disciplina de Prática de Projetos II, neste semestre, o projeto a ser desenvolvido no PP2 é um conjunto de habitação de interesse social inserido em contextos urbanos de áreas centrais, não sendo por acaso a escolha de um terreno em Montevideo. Ainda nessa tarde fez-se uma visita ao Cabildo de Montevideo, Cabildo são os edifícios administrativos das cidades coloniais espanholas, equivalente às Casas de Câmara e Cadeia portuguesas. Depois foi dado um tempo para passeios livres e compras de souvenires.
Marcou o final deste dia a oportunidade de ir ao Museu Nacional de Artes Visuales, onde ocorria a mostra Picasso en Uruguai, com pinturas, desenhos e esculturas das diferentes fases da carreira de Pablo Picasso.
No último dia em terras uruguaias, a delegação da ULBRA Torres foi especialmente recebida na Casa Museu Vilamajó. Casa construída em 1930 por Juan Vilamajó para ser sua moradia e que hoje é um museu, mantido pela Faculdade de Arquitetura, que conta a história da casa e com ela um pouco da história da arquitetura moderna no Uruguai e da vida e carreira do arquiteto.
A segunda visita do dia foi um passeio guiado pelo Palácio Legislativo, monumental edifício neoclássico construído entre 1902 e 1925, que coroa a perspectiva da Av. del Libertador e abriga as duas casas legislativas nacionais, a Câmara dos Deputados e o Senado. Na visita o grupo aprendeu sobre o sistema de governo uruguaio enquanto conhecia os salões nobres e as salas dos plenários do parlamento.
Do palácio legislativo seguiu-se até o Mercado Agrícola de Montevideo, uma edificação em estrutura de aço do início do século XX, que foi recentemente restaurada e adequada para o funcionamento de um moderno mercado de produtos locais. Foi mais uma oportunidade de almoçar a culinária tradicional e adquirir souvenires de viagem, antes de iniciar o caminho de volta.
Saindo do mercado agrícola, já no percurso de volta para o Brasil, a última parada foi novamente nos arredores de Punta del Este para conhecer a arquitetura contemporânea do arquiteto brasileiro Isay Weinfeld, que projetou os 32 bangalôs do complexo no ano de 2010 e do escritório uruguaio Obra Prima, responsável pela ampliação e construção do edifício da Locanda Las Piedras, em 2016, no Hotel Fasano Las Piedras. No hotel o grupo foi cordialmente recebido e guiado em visita às diversas instalações do complexo, que, com suas formas abstratas e puras se inserem respeitosamente numa elevação rochosa na paisagem natural do pampa uruguaio.
Finalmente, o retorno à Torres, trazendo na bagagem um pouco da cultura uruguaia e a memória, fotos e desenhos da arquitetura e dos lugares visitados. Viagens como essa, que propiciam a vivência e a fruição in loco dos ambientes arquitetônicos, são uma experiência fundamentais para a formação do arquiteto e urbanista, que deve adquirir certa vivência do mundo. Esta iniciativa, junto com outras tantas ações que congregam os professores e alunos, contribui para o reforço de um sentimento de pertencimento e valorização e ajuda a manter este curso de excelência, avaliado pelo MEC como o melhor entre as instituições privadas do Estado.
O curso de Arquitetura agradece aos alunos interessados e participativos que fizeram essa viagem e aos professores organizadores Efreu Quintana e Renata Matos, aos professores Anallu Barbosa e Marcos Bueno que acompanharam o grupo, ministraram aulas e ajudaram a guiar a comitiva nas visitas e percursos. Agradece em especial a todas as pessoas, instituições que tão cordialmente receberam o grupo de alunos e professores da ULBRA Campus Torres.